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ENTREVISTAS

03/2023

Diana Lucila Velarde Torres
Diana Lucila Velarde Torres

Temos a honra de apresentar
nossa primeira entrevistada internacional:
Diana Velarde, 39 anos,
de Monclova e agora moradora
da Cidade do México.
Ela relata como convive com a Síndrome de Usher
e também fala um pouco
de acessibilidade no México.
Confira a entrevista em português
e em espanhol!

1) Diana, conte para nós como descobriu sua surdez. Qual é o grau da sua perda auditiva?

Com aproximadamente 3 anos, meus pais perceberam que eu não ouvia da mesma forma que minha irmã mais velha. Por exemplo, eles esperavam que quando eu ligasse o liquidificador na cozinha, eu reagiria e me viraria para ver a origem do barulho, e não o fiz. Aí começou uma série de visitas aos médicos, que diziam que eu estava bem, que não tinha problema de audição. Até os 5 anos de idade, um médico me diagnosticou com perda auditiva neurossensorial bilateral e, um ano depois, comecei a usar aparelhos auditivos. Minha surdez tem estado estável durante a maior parte da minha vida, mas eles descobriram há cerca de um ano que minha perda auditiva progrediu recentemente. Atualmente, tenho cerca de 85% de perda.

 

2) Você usa aparelhos auditivos até hoje? Conte para nós como você se adaptou ao usar as próteses.

Sim, uso aparelho auditivo desde os 6 anos de idade, e lembro que nos primeiros anos resisti ao uso, era menina e tinha meus medos e inseguranças. Então eu os usava apenas na escola. A partir dos 18 anos, a cada 6-7 anos, troco os aparelhos auditivos por um novo modelo. A cada substituição tem sido difícil para mim me adaptar, pois cada um vem com uma tecnologia diferente, e é como se o cérebro tivesse que se adaptar para ouvir novamente de uma forma diferente. Nesse período de adaptação, são várias as idas ao fonoaudiólogo para ajustar as configurações, até que depois de alguns meses posso dizer que já me adaptei.

 

3) E na escola, como você se adaptou às suas dificuldades auditivas?

No ensino fundamental eu estava no sistema Montessori, que permitia uma educação mais personalizada. Quando passei para a escola secundária, fui para um esquema mais tradicional e a chave era comunicar com antecedência à direção e aos professores, para que me permitissem sentar na parte da frente da sala de aula e, acima de tudo, que haveria aquela consciência de que eu poderia exigir que eles repetissem para mim algo que disseram. Em termos de aprendizagem de uma língua estrangeira (inglês em vários estágios e japonês durante a faculdade), eu não conseguia ouvir bem o que estava sendo dito nos gravadores, pois dependo da leitura labial. Então, nesses casos, solicitei que essa parte da avaliação fosse omitida ou que alguém narrasse essa parte do exame diretamente para mim.

 

4) Diana, conte para nós como você descobriu a retinose pigmentar.

Comecei com os sintomas de cegueira noturna aos 19 anos. Aos 15 e 17 anos, participei de um projeto de assistência social em uma cidade muito pequena, distante da civilização, no deserto do norte do México, onde a eletricidade é muito limitada. Nessas duas ocasiões eu tinha conseguia enxergar bem à noite, mas quando voltei aos 19 anos, percebi que não via mais o mesmo. Atribuí isso ao esgotamento da universidade, mas aos poucos meus amigos, irmãos e meu companheiro na época começaram a ajudar a me locomover à noite ou em locais com pouca luz. Fui a oftalmologistas em diversas ocasiões, mas eles me diagnosticaram com astigmatismo. Até que aos 25 anos um oftalmologista localizou os pigmentos na minha retina e pela primeira vez na minha vida ouvi as palavras Retinose Pigmentar, que mais tarde me confirmaram com estudos.

 

5) E foi assim que você descobriu que tem a síndrome de Usher?

Fui a um especialista em retina pela primeira vez aos 25 anos para falar sobre a retinose pigmentar que o outro oftalmologista havia encontrado e, quando fiz meu histórico médico, surgiu o assunto da deficiência auditiva. Então o retinólogo mencionou para mim que eu provavelmente tinha a síndrome de Usher, mas que só poderia ser confirmada geneticamente.

 

6) Você fez o teste genético? Em caso afirmativo, qual é o seu tipo e subtipo (gene)?

Sim, depois da minha primeira visita ao retinólogo, esperei vários anos até que decidi fazer um teste genético em um laboratório nos Estados Unidos, que confirmou que meu diagnóstico é a síndrome de Usher tipo 2A (USH2A).

 

7) Qual foi sua reação quando descobriu que tem a Síndrome de Usher?

No começo foi devastador, caí em um certo nível de depressão e, portanto, comecei a fazer terapia psicológica. Minha mente me dizia: "Eu já tenho deficiência auditiva e agora também tenho deficiência visual?". E parecia muito injusto para mim. A terapia, juntamente com outras coisas como o apoio da minha família, permitiu-me aceitá-la, abraçar a minha condição e ganhar um novo impulso para continuar com os meus planos de vida.

 

8) Há mais casos de Síndrome de Usher na sua família?

Não, sou o primeiro caso na minha família, o que é muito comum nos casos de Usher por se tratar de uma condição recessiva.

 

9) Após o diagnóstico da Síndrome de Usher, você precisou adaptar sua vida, mudar sua rotina?

Não tão imediatamente, a mudança foi gradual. Talvez o mais imediato tenha sido alertar meus círculos sociais e de trabalho sobre minha condição, caso eu precisasse de apoio a qualquer momento. Com o tempo fui buscando técnicas para me adaptar, por exemplo, quando me mudei para a cidade procurei morar em um apartamento bem próximo ao meu local de trabalho, sempre carrego uma lanterna na bolsa, etc.

 

10) Diana, conte para nós como é a acessibilidade para pessoas com deficiência no México.

Infelizmente ainda há muito a fazer em termos de acessibilidade para pessoas com deficiência no México. Por si só, existe alguma consciência das necessidades de acessibilidade para pessoas com deficiência motora em alguns locais, mas nem isso é suficiente. Para as pessoas com surdocegueira, surdez, cegueira ou baixa visão, ainda falta muita cultura sobre nossas necessidades.

 

11) Existe acessibilidade para pessoas com surdocegueira? Se sim, por favor, diga-nos como este trabalho é feito.

Muito pouco, infelizmente. A acessibilidade que existe tende a focar nas opções de surdos e cegos separadamente, mas pelo menos isso existe.

 

12) Diana, você se tornou uma pessoa melhor depois de descobrir a Síndrome de Usher?

Acho que sim, viver com uma deficiência múltipla fez com que eu me tornasse mais resiliente, corajosa, criativa na busca de opções e, acima de tudo, empática com as diferenças, o que acredito me permite abraçar mais a diversidade, não apenas em termos de deficiência. Isso me levou a me envolver em diferentes causas de ativismo para ajudar outras pessoas como eu, de diferentes perspectivas. Por exemplo, sou embaixador no México da Usher Syndrome Coalition, uma organização não governamental com sede nos Estados Unidos. Também trabalho com questões de interseccionalidade de gênero e deficiência em um movimento chamado "Mulheres Mexicanas com Deficiência". Por outro lado, reconhecendo os desafios que a minha condição não é muito visível, juntamente com um amigo co-fundei o projeto "Tracing the Invisible", um espaço de sensibilização para as doenças raras e deficiências invisíveis. Da mesma forma, sou um dos coordenadores da comunidade de mexicanos com RP e Usher, organizando diferentes eventos presenciais a cada ano. E, finalmente, no meu local de trabalho, estou envolvida voluntariamente em diferentes iniciativas de Diversidade e Inclusão. Eu acho que, se eu não tivesse uma deficiência, eu não teria essa preocupação de buscar melhorar esse mundo.

 

13) Diana, conte-nos mais sobre sua participação em projetos relacionados a pessoas com deficiência e pessoas com síndrome de Usher: Você consegue atingir os objetivos? Existem grandes compromissos da comunidade? O governo mexicano também contribui para incentivar seus projetos?

Como comentei em outra pergunta, estou envolvida em uma organização chamada "Mulheres Mexicanas com Deficiência", que trabalha com questões de interseccionalidade de gênero e deficiência. Da mesma forma, sou cofundador do "Trazando lo Invisible", um espaço no qual buscamos conscientizar sobre doenças raras e deficiências imperceptíveis. E, finalmente, sou embaixador no México da Usher Syndrome Coalition. Nos 3 projetos conseguimos atingir diferentes objetivos de trabalho, mas claro que ainda há muito trabalho a fazer e chegar a mais pessoas. Temos um setor da sociedade que nos apoia, mas ainda há muita informação ruim. E infelizmente não temos incentivos do governo mexicano para este tipo de projetos relacionados à deficiência, pois ainda existe uma abordagem assistencialista em vez de trabalhar com o modelo social da deficiência.

 

14) Diana e para finalizar, que conselho você dá para as pessoas que acabaram de descobrir que têm a Síndrome de Usher?

Meu conselho é se aproximar de uma comunidade próxima de pessoas com Síndrome de Usher, com quem você possa interagir, conhecer pessoalmente e encontrar aquele acompanhamento ali no processo de querer tirar muitas dúvidas, adaptar, aprender novas formas de fazer as coisas  etc. Elimine todas as dúvidas, para que entendam que esta condição não é o fim do mundo, mas outra coisa com a qual temos que aprender a conviver, e que com ela podemos ter uma vida plena. 

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