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COM SÍNDROME DE USHER
E A SEUS FAMILIARES, PROFISSIONAIS E AMIGOS
ENTREVISTAS
04/2023
Jéssica Bramorski
Jéssica, 31 anos,
nasceu em Massaranduba
e atualmente mora em
Jaraguá do Sul, Santa Catarina. Nesta entrevista ela nos conta
como descobriu gradativamente
a surdez e a retinose pigmentar
e também sobre a convivência
de sua família com a sua
síndrome de Usher.
Confira!
1) Jéssica conta para nós como perceberam que você não estava escutando direito...
A minha mãe já percebia a minha surdez desde quando eu era muito pequena... Porque mãe sabe das coisas, né? Ela percebeu que várias vezes eu chegava perto da TV para ouvir e até comentou com meu pai, mas ele falava que não era nada.
Quando eu comecei a frequentar a escola, no pré, a professora também percebeu que eu não escutava direito, então ela chamou os meus pais e contou que eu estava tendo dificuldades para ouvir e fazer as atividades. Foi aí então que eles resolveram marcar uma consulta. Passei com um otorrino, fiz os exames e ele constatou que eu estava surda e disse que precisava usar aparelho auditivo.
2) E como foi sua adaptação com os aparelhos auditivos?
Eu usei o aparelho auditivo somente no ouvido direito e a adaptação foi tranquila, eu me acostumei rápido, passei a ouvir melhor apesar de sentir vergonha e também sofria bullying por isto... Então, eu procurava sempre tampar a orelha com os cabelos, sabe? E depois, na adolescência, eu também tinha essas coisas... Só depois de adulta é que perdi a vergonha e assumi minha surdez.
3) E hoje como você está a sua audição?
No ano passado quando eu fui fazer o acompanhamento anual da audição, constataram que eu tive uma perda severa no meu ouvido esquerdo e por este motivo, comecei a usar no esquerdo também. Agora estou usando nos dois ouvidos, e eu já me adaptei, está bem tranquilo.
4) E em relação a visão, quando você começou a perceber suas dificuldades para enxergar?
Então, eu tinha mais ou menos uns 18 anos, quando percebi que estava com dificuldades para enxergar à noite. Eu já estava com cegueira noturna, mas não sabia disto, achava que era normal, apesar de eu esbarrar nas coisas e nas pessoas... O problema é que eu sempre achava que tudo isto era normal, que eu era desastrada e realmente não tinha noção da gravidade, não achava que tinha problemas visuais.
E eu levei isto adiante até quando tive a minha filha Heloisa, aos 26 anos de idade, e um tempo depois, quando ela completou 1 ano e meio, eu apresentava muito mais dificuldades visuais: deixava cair as coisas no chão e não achava, pisava nos brinquedos da minha filha, esbarrava mais nas pessoas e muitas outras coisas... E tudo isto acontecia com mais frequência que antes e tanto que Emerson, meu esposo disse que precisava ir no médico: inclusive foi ele que tomou a iniciativa, marcou consultas com um oftalmo e enfim, depois tive o diagnóstico da retinose pigmentar.
5) Mas no seu caso, na primeira consulta com oftalmologista já teve o diagnóstico da retinose pigmentar?
Não... No começo, eu fiz uma série de exames e com os resultados na mão, o meu próprio médico não tinha muita certeza do meu diagnóstico porque nunca teve um paciente com este problema. E, portanto, ele procurou conversar com um amigo dele, também oftalmo, em uma outra cidade, Joinville, para estudar meu caso.
Depois disto retornei à consulta e finalmente confirmou o diagnóstico da retinose pigmentar. Na hora que me falou sobre isto, ele foi muito atencioso e teve cuidado com as palavras, sabe? Explicou passo a passo da doença, disse que por enquanto não tem cura, não tem tratamento e recomendou para fazer sempre o acompanhamento e os exames para ver como a minha visão está. Senti muita confiança da parte dele, tanto que até hoje continuo me consultando com ele.
6) Foi aí também que você teve o diagnóstico da síndrome de Usher?
Não... Depois que soube do diagnóstico da retinose pigmentar, consultei com outros profissionais, porque eu e meu esposo queríamos ter uma segunda opinião e para saber se tinha esperança de um tratamento. Em 2019, tive a oportunidade de passar com a Dra. Mariana Valin, quando ela estava em Curitiba. Ela também foi muito atenciosa e praticamente confirmou tudo que sabíamos sobre a retinose pigmentar e foi ela que me deu o diagnóstico clínico de Síndrome de Usher.
7) Você fez o teste genético para comprovar sua Síndrome de Usher?
Sim. Fiz o teste genético gratuito organizado pelo Grupo Retina Brasil. Depois de pronto o exame, passei por uma consulta online com a Dra Juliana Sallum e o meu diagnóstico genético confirmou que era realmente síndrome de Usher e no meu caso é do tipo 2A, um dos tipos mais comum da síndrome.
8) Na sua família tem mais casos de síndrome de Usher ou de retinose pigmentar?
Olha, eu tenho mais duas irmãs e eu sou a mais velha e sou a única da família com essa síndrome. Ninguém da minha família tem a retinose pigmentar. Mas depois que eu soube que a síndrome de Usher é genética, fiquei desesperada, porque pensei que a minha filha também pudesse ter, mas graças a Deus ela não tem, ela enxerga super bem e é super atenta!
9) Jéssica e qual foi a sua reação ao saber dessa síndrome? E sua familia como ficou?
Fiquei arrasada... bem abalada mesmo! Eu lembro que a gente saiu da clínica, aí quando eu entrei no elevador, eu já cai no choro, tipo não deu nem tempo de chegar no carro... Fiquei desesperada, porque eu tinha uma bebê em casa, então eu só conseguia pensar em como o médico disse, ele foi sincero e falou que a retinose pigmentar poderia levar à cegueira total. Então eu só pensava assim: “Por que agora que eu estou vivendo a melhor fase da minha vida?” e daí fiquei pensando em muitas coisas, fiquei arrasada mesmo. No começo foi muito difícil, viu? Foram dias de angústia, medo e só com o tempo pude superar esta fase...
Mas mesmo assim, o meu marido esteve comigo o tempo todo, me deu muito apoio. Minha família e colegas de trabalho também foi um choque saber do meu diagnóstico, mas me deram muita força. Eles sabendo disto, nos ajudam e sabem das minhas necessidades, das minhas prioridades, das minhas limitações e entendem isso.
Minha mãe sentiu muito e eu me coloco no lugar dela... porque eu como mãe também ficaria arrasada se eu soubesse que a minha filha teria também.
10) Depois que você soube da Síndrome de Usher, você passou a pesquisar mais sobre o assunto?
Olha, no fundo, quem acabou se aprofundando mais no assunto foi meu marido.... rs Ele é que fez e ainda faz muitas pesquisas, se interessa por esse assunto que tanto que ele agora é presidente da Retina Santa Catarina. Tenho muito orgulho dele lutar por esta causa, ele sempre procura ajudar as pessoas a ter mais informações sobre as doenças da retina. Emerson também já deu palestras no Senai e Sesi aqui no Jaraguá do Sul. Lá eles fizeram um trabalho muito legal criando um joguinho de dominó para cegos. Em dezembro do ano passado, fomos para Florianópolis para buscar o meu aparelho auditivo e aproveitamos para conhecer uma instituição para cegos chamada ACIC (Associação Catarinense para Integração do Cego) e levamos esse joguinho de dominó para eles usarem e foi muito legal. Lá conversamos com o diretor e ele nos apresentou o pessoal, mostrou toda a instituição, inclusive a biblioteca que é coordenada por uma senhora totalmente cega e ela fica o dia inteiro lá, lendo livros em braile e eu fiquei muito emocionada ao vê-la tão dedicada!
O Emerson então, está sempre se atualizando, já participou também de várias reuniões com todo o pessoal da Retina Brasil e está ganhando muita experiência com esse trabalho voluntário.
11) E na sua família, vocês tiveram que adaptar a sua casa por causa da sua Síndrome de Usher?
Olha, na verdade apenas colocamos mais iluminação aqui em casa. O resto eu já me acostumei com as coisas aqui de casa em seus devidos lugares... rs
12) Jéssica, sua filha já tem noção das suas dificuldades visuais e auditivas?
A Heloísa hoje ela tem 5 anos de idade e sim, ela tem ela já tem noção das minhas dificuldades, aliás ela me ajuda muito. É incrível de ver como ela lembra quando a gente sai de casa, e dependendo do lugar, ela já diz: “Mamãe, toma cuidado com o degrau!”, “Mamãe cuidado para não bater a cabeça!”... Ela é pequena, mas entende as minhas limitações. Tenho muito orgulho dela.
13) Na sua opinião, você acha que se tornou uma pessoa melhor depois do diagnóstico da síndrome de Usher?
Depois que tive esse diagnóstico, para mim foi uma lição, porque a gente aprende a ver a vida, a viver a vida de forma mais leve, aproveitar mais os momentos com as pessoas que a gente gosta. Com o tempo, a gente percebe o que temos não é um problema, mas é uma lição de vida, é um algo que aprendemos a lidar no dia a dia.
14) Jéssica, que conselho você dá para pessoas que acabaram de descobrir que tem síndrome de Usher?
É difícil eu sei... No começo ficamos assustados, com medo... Mas acredite que tudo vai passar. Com o tempo você vai ficando mais seguro, mais tranquilo e esse medo, essa angústia vai passar e aí você vê que vai viver uma vida normal como qualquer pessoa. E assim eu digo com muita fé em Deus e é também fundamental contar com o apoio e ajuda da família e amigos, o que torna a nossa vida mais leve e mais segura. Eu acho que tudo na vida é uma lição e a gente passa por certas dificuldades talvez para ver o quanto nós somos fortes e somos capazes de fazer qualquer coisa.
Para saber mais sobre a Retina Santa Catarina:
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(47) 99185-4615
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